sábado, 27 de agosto de 2011

Telefone

   Ele estava saindo do escritório, cansado e estressado.Tinha em sua mente a exaustão de chegar em casa e ter que preparar o jantar, as planilhas para o dia seguinte, a ata da reunião de quinta. Tudo isso sozinho.
   Quando colocou a chave na ignição, ouviu o telefone público tocar. Não havia mais ninguém naquele estacionamento, então resolveu atender.
   - Alô...?
   - Alô o caramba!  Cala a boca e me escuta. Eu não sou mulher de correr atrás de homem nenhum e você não vai ser exceção. Não me importo que você não me dê flores, mesmo sabendo que eu adoro. Não me interessa o quanto você trabalha, eu estou sempre lá pra te dar atenção. Nunca reclamei quando você saía pra jogar futebol, nunca falei mal de você pra ninguém. Por que eu te amo, cafajeste. Mas já tô cansada dessa negligência sua. Acabou o fogo da paixão e parece que o nosso namoro acabou junto. Eu não suporto a ideia de você estar longe de mim e, o pior, com outra! Eu já aguentei demais disso tudo. Cansei de esconder a minha indignação e chorar no banheiro, escondida. Cansei de você! Eu vou procurar um homem decente pra mim. Que goste de mim e não tente me mudar. Eu quero alguém que me dê o valor que você nunca deu. Um cara carinhoso e romântico, que não seja só corpo e beleza como você. Quero alguém que me mereça e que mereça tudo o que eu tenho pra oferecer. Acabou, Luiz Carlos. Pra sempre!
   Houve um momento de silêncio, enquanto a pessoa da outra linha chorava.
   - Moça, meu nome é Gustavo e esse é um telefone público.
   - Ah, meu Deus. Desculpa, moço. Acho que errei o número.
   - Tudo bem. Você quer jantar comigo... pra conversar?
   - Isso seria estranho.
   - É, tem razão.
   - Mas eu aceito.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

O autor desconhecido

   Tinha um menino na minha aula há um tempo atrás, não lembro o nome dele. Talvez eu nem saiba o nome, ou não seja importante. Ele sentava bem ao fundo e nunca falou com ninguém. Era meio estranho, mas eu tinha uma simpatia especial por aquele garoto calado. Acho que me identificava com ele. Sei lá.
   Lembro perfeitamente um dia em que ele chegou na escola com uma rosa vermelha e entregou à professora.Todos riram dele, menos eu e a professora. Ambos estávamos muito encantados com aquele gesto e não debochamos. Ela sorriu e agradeceu, eu sorri. Ele também sorriu, mas cabisbaixo. Parecia estar tentando esconder sua alegria ou algum outro sentimento dentro de seu sorriso amarelo.
   Uma menina sentava atrás de mim e, se não me engano, se chamava Aline... ou Marina... Todas as manhãs, ela passava por mim e sorria. Eu sorria de volta. E era feita disso, a nossa amizade.
Eu ficava horas imaginando como seria beijar ela. Como seria olhar no fundo dos seus olhos verdes e dizer o quanto ela era importante pra mim. E que era ela - e só ela - que enfeitava meus sonhos à noite.
Nada disso tinha a vontade suficiente para pular fora do meu peito, das minhas mãos e boca, e ir ao encontro do seu Eu também... A vontade existia, e como existia, mas talvez me faltasse coragem.

Emptiness...

     Quando estamos tristes, costumamos ficar idealizando amores perfeitos, paraísos, ilusões e tantas milhões de coisas sobre as quais não convém falar agora. Mas a grande verdade é que todas as coisas que a gente idealiza nessas horas nada mais são do que nosso subconsciente pedindo socorro.
     Sim, porque é normal se sentir triste às vezes; e na verdade isso até é saudável se essa tristeza não for tão intensa que te leve ao fundo do poço umas mil e quinhentas vezes por dia. Quando isso acontece, essa tristeza se chama amor não correspondido. Ou talvez sim, correspondido. Mas não da forma como gostaríamos que fosse.
     Às vezes é comum ficar triste, mas a tristeza pode ser uma saudade de algo que talvez nunca tenha existido. Nessas horas, é normal sentir uma vontade súbita de gritar para ver se alguém está ali por nós. Mas mais normal ainda é sentir vontade de ter alguém ali sem precisar gritar. Porque na grande maioria das vezes em que isso acontece estamos tão desesperados que o nosso grito é interno. E o grito interno é a forma mais ridícula e obscura de sentir-se vivo, pois ele corrói muito mais do que as cordas vocais. Ele corrói a alma.

Cinco sins e um talvez.

Eu caminhava na chuva fria, de madrugada, voltando pra casa.
Imagens passam voando pela minha cabeça e se chocam com ideias tristes. Estou cansado de tudo e de todos. A chuva escorre pelo meu rosto: um convite às lágrimas, que insistem em ficar em segredo. Não choro, apenas ando.
O olhar torto dos transeuntes, como se eu fosse de outra espécie. O número de críticas muito maior do que o de elogios, como se a minha autoestima fosse grande o suficiente para aguentar. A pressão dos pais, como se eu fosse prático e não sonhador. A namorada inconformada com o meu jeito de ser, como se eu tivesse namorada...
A sociedade como um todo parece estar contra mim. A chuva cai, lava esses pensamentos e escorre pelo chão. Chegando em casa, tiro a roupa encharcada e deito na cama quente, tranquilo. E durmo. Amanhã é outro dia.
Sim. Eu tenho esperança.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Três anos

Ela se mudou para a rua onde ele nasceu e cresceu. De vez em quando trocavam, tímidos, oi e tchau. Era isso. Só isso.
Logo que a adolescência começou a mostrar sua garras, a amizade cresceu mais e mais. Ela estava chorando na grama da calçada e ele chegou. Sentou-se ao lado dela, calado, e ali permaneceu. Os dois trocaram olhares, após longos minutos de silêncio e lágrimas. Obrigada. - Disse ela. E ele sorriu.
Meses se passaram e os dois se tornaram melhores amigos. Ela o ajudava a conquistar as garotas, a ter coragem de falar com elas. Ele enxugava suas lágrimas, quando algum menino a desapontava.
Era uma amizade sincera. Dessas que me emociono ao ver. E que muitas pessoas invejam. Eu também, assumo.
Uma irmandade cristalina. Pura. Delicada e, ao mesmo tempo, formada em laços fortes.
Ele não era um menino que se comente, ou que se note. Era simples. Tímido.
Ela, por sua vez, era inconsequente e desmedida. Era confusa. Complicada.
Ambos eram únicos. Cada qual a seu modo.

domingo, 8 de maio de 2011

Um beijo

   Ela sempre ia ao mesmo restaurante, ao mesmo bar, e fazia a mesma coisa. Era linda, mas escondia sua face com maquiagens pesadas e óculos que não precisava usar senão para ler. Seus cabelos eram lisos, sua voz rouca e seu olhar, simplesmente, avassalador. E ela fazia a mesma coisa. Sempre.
- Oi. Posso te pagar um drink?- perguntava o cavalheiro.
- Sim.- respondia, simpática.
- Um uísque para mim e um...
- Chardonnay...
- ...pra moça.
   O bartender já estava acostumado com a cena. Eles conversavam, e conversavam, e bebiam, e conversavam. Então, o cavalheiro diz algo em seu ouvido e ela balança a cabeça negativamente. Ele sai do bar sozinho, e ela fica ali. Sozinha.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Rápido e estranho

   Ela era uma visão do paraíso. Ele ficou ali sentado na classe. Conversava com alguns amigos, mas silenciou quando ela entrou na sala e veio em sua direção. Os colegas seguraram risadas - já conheciam ele -. O quê eu falo? O que eu faço? Meu Deus, me ajuda!! - Oi.
   - Eh, oi.- Respondeu (tímido) normalmente.
   - Aqui é a sala 113?
   - Ah, é, hum... É, sim. Você é a aluna nova?
   - Aham. Meu nome é Juliana.
   - Muito prazer, Ju.- Ele sorriu. Além de linda, era simpática.
   - Ju, não. Juliana.
   - Ah, desculpa. Eu sou o Dani.
   - Dani...
   - Não, Daniel.
   Era estranho uma pessoa tão... TÃO vir falar com ele. Nem os amigos entendiam. Era coisa de destino, carma, Deus... Ou algo assim.

sábado, 30 de abril de 2011

Sobre as coisas

     E aí, estava pensando em ti, confesso. E sobre toda essa admiração que só cresce. Bem, pelo menos às vezes parece crescer em marcha lenta, embora nunca pare.
     Ri de mim mesmo, lembrando como às vezes leio um pensamento que você explicitou, ou uma frase que você deixou em destaque, e abro um sorriso. Aquela crença infantil de que você poderia estar dedicando essas grandes obras de grandes gênios, poetas, a mim.
     E sobre os poucos momentos em que passamos juntos, você já percebeu que perco a voz? Perco o ar.
     E sobre os momentos em que parece que não ligo pro que está acontecendo? Acredite, não sou neutro. Tenho plena consciência de que você está por perto. Sinto sua presença, tenho consciência de cada movimento seu, nenhum passa despercebido.
     E sobre a minha percepção me permitir ouvir sua respiração de longe? Pra ser sincero, eu também não compreendo, mas sei que é só com você. E finjo não me decepcionar ao notar que ela não fica ofegante como a minha quando nos aproximamos.

terça-feira, 26 de abril de 2011

Inquieta

E na insanidade daquele dia de confusão mental e stress, acendeu um cigarro. Acendeu, e logo após pensou: - nunca mais conseguirei colocar a cabeça no lugar e ser feliz com esse meu doce coração amargurado. Não atrairei olhares, meu sorriso não brilhará e simplesmente passarei despercebida. Não marcarei encontros, não relerei velhas cartas de amor, não ouvirei aquela música que pouco antes me fazia vibrar. Não escreverei frases ou textos românticos. Não me lembrarei do cheiro, não pensarei mais. É sério, não amarei outro alguém. Não serei amada por outro alguém. Sou feia, sou estranha. Se não for ela não será mais ninguém. Afinal, quem poderia me amar desse jeito? Romântica, fumante e, por vezes, desequilibrada. Se cruzarmos na rua, que bom, não sentirei nada mais! Não trocarei olhares, não nos abraçaremos, não tentarei sentir seu perfume doce no ar, e não prestarei atenção na sua roupa. Estarei bem, alegre e sorridente. Por dentro, destruída em mil pedaços, eu sei. Mas ainda assim, sorridente. Ao retornar a olhar pra frente... Não, não! Por que olhar pra frente se fingirá que não a vi, e o mesmo farei eu...? Não faz nenhum sentido. Não olharei. Definitivamente, não olharei.  E pensou:
 “How could she say to me
Love will find a way…?”

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Velhas gavetas

   Sempre haverá coisas interessantes escondidas em velhas gavetas. Coisas que nem lembrávamos mais, de tempos atrás. Às vezes são cartas de antigos amigos, ou grandes amores, que a vida levou, e que os rumos diferentes foram, lentamente, fazendo-nos esquecê-los.
   Fotos que ficaram perdidas e, sem terem álbum para guardá-las, caíram no esquecimento. Fotos de família – Ah, como eram legais aqueles domingos! E ficamos sentados na cama, lembrando e sorrindo.
   Num fim de tarde qualquer em que a casa e a rua descansam, e nada temos a fazer, encontramos meio que sem querer um rabisco colorido no fundo da segunda gaveta de um armário. – PAI EU TE AMO! Naquela letra desajeitada de quem vive no próprio mundo de fantasias, enxergamos a nós mesmos, anos atrás. E as imagens vão aparecendo pouco a pouco...
   – Como eu pude mudar tanto a ponto de não mais demonstrar o amor que sinto? O sentimento é o mesmo, eu é que estou diferente.