segunda-feira, 16 de maio de 2011

Cinco sins e um talvez.

Eu caminhava na chuva fria, de madrugada, voltando pra casa.
Imagens passam voando pela minha cabeça e se chocam com ideias tristes. Estou cansado de tudo e de todos. A chuva escorre pelo meu rosto: um convite às lágrimas, que insistem em ficar em segredo. Não choro, apenas ando.
O olhar torto dos transeuntes, como se eu fosse de outra espécie. O número de críticas muito maior do que o de elogios, como se a minha autoestima fosse grande o suficiente para aguentar. A pressão dos pais, como se eu fosse prático e não sonhador. A namorada inconformada com o meu jeito de ser, como se eu tivesse namorada...
A sociedade como um todo parece estar contra mim. A chuva cai, lava esses pensamentos e escorre pelo chão. Chegando em casa, tiro a roupa encharcada e deito na cama quente, tranquilo. E durmo. Amanhã é outro dia.
Sim. Eu tenho esperança.

Eu estava sentado no banco, fumando um cigarro e esperando o transporte para voltar. Mais um dia normal. Quando levantei para subir no ônibus, ela desceu e me viu. Ali começou.
Era tão linda e tão meiga no jeito de andar. Ela veio em minha direção e me pediu o isqueiro. Alcancei a ela, mas quando pegou na minha mão, eu segurei firme e disse que só emprestaria se ganhasse algo em troca. Ela sorriu e disse seu nome. Eu larguei o isqueiro, tinha ganho uma informação.
O ônibus partiu e eu nem me abalei. Resolvi caminhar com ela até sua escola, já que ela concordou. Uma novata na cidade. Poucos amigos, apesar de não fazer o tipo tímida. Era mais pra reservada.
Quando chegamos à escola, ela pegou a mochila que eu estava carregando e agradeceu com um beijo na bochecha. Eu falei que merecia mais do que aquilo e passei as mãos na sua cintura. Ela sorriu outra vez e nos beijamos. Ali recomeçou.
Sim. Eu estou apaixonado.

Numa fria noite de inverno, o vento sopra forte e a cama me convida a descansar.
Ouço a brisa lá fora e uma corrente de ar entra furtivamente e me acaricia. O homem da rádio fala comigo. A música me lembra ela, mas ela não está aqui. Provavelmente, está deitada na sua própria cama. Pensando em mim, talvez?
Vejo o seu nome rabiscado no escuro, como se pedindo pra não a esquecer. Lembro da sua risada e do seu olhar encabulado. O homem fala novamente, se despedindo dos ouvintes - A noite de chuva é um presente que deve ser aproveitado amando. Boa noite. Eu adoraria, senhor. Adoraria mesmo.
Outra brisa fria percorre a minha espinha. Um calafrio. E a chuva me acalma. E o travesseiro me conforta. E você não está aqui. O cobertor aquece... mas não abraça.
Sim. Eu estou sozinho.

Sem saber nada além do nome e a escola onde estudava, fui em busca dela. Cheguei muito adiantado e todos ainda estavam tendo aula. Fui caminhar pelo centro da cidade.
A cada bar, a cada café, a cada praça eu pensava - Será que ela conhece? Será que ela gostaria de vir aqui depois?
Quando ela saiu no portão, eu joguei o meu cigarro no chão e coloquei um chiclete na boca. Ficou confusa por me ver ali. Não esperava aquilo e negou meu beijo. Eu fiquei mais confuso ainda e pedi explicações. Ali começou.
Ela já não era a mesma do outro dia. Falou em não querer compromisso, ser livre e outras bobagens. Eu me defendi com o meu habitual discurso de não querer nada muito sério também, mas não adiantou. Ela percebeu que eu mentia.
Disse que eu era chato e usou a velha desculpa de não nos conhecermos direito. O orgulho gritava de dentro da minha alma e meu coração falava pra não desistir. O grito foi mais alto. Ali terminou.
Sim. Eu estou furioso.

Reclamo de tudo o que aconteceu para alguns amigos. Eles me xingam, dizem que eu sou burro e que eu fiz tudo errado. Mas uma menina no outro lado da sala ouve tudo atentamente e sorri pra mim. Um sorriso torto, uma mensagem de que tudo ficará bem. Foi pouco, um olhar e um sorriso. Foi simples. Só que foi exatamente o que eu precisava.
Chamei ela pra ir até a praça e conversar. Ela aceitou, mas com a condição de eu aceitar um beijo na bochecha. Eu ri daquilo e percebi como eu tinha sido realmente bobo com a outra, mas aceitei.
Sentamos à beira do lago, no chão. Ela disse que eu não devia julgar todas as meninas por uma ou duas que foram cruéis comigo. O argumento foi bom, admito. Mas não bastou. Eu ainda achava que tudo iria ser sempre da mesma maneira. Sempre.
Eu falei que não queria mais conversa e papo furado sobre o que pode acontecer um dia. Eu quero ver acontecer. E só o que eu vi até hoje foi eu triste e elas satisfeitas.
- É por que você está procurando nos lugares errados. Você está tentando achar a mulher certa nas comuns. Ela era tão firme nas palavras, parecia mesmo que tinha certeza do que dizia. Foi ali que começou.
Continuamos conversando e discutindo fervorosamente sobre as minhas decepções. Até que ela teve que ir embora e eu me ofereci para acompanhar. Disse que não precisava e me mandou ir para a minha casa. Obedeci e ainda pensei que essa era uma mulher de verdade. Foi ali que recomeçou.
Sim. Eu sou teimoso.

Pensei que não poderia mais gostar de alguém. Fiquei certo de que nenhuma mulher poderia gostar do meu jeito estranho de ser. E, mais uma vez, me enganei. Ela estava ali o tempo todo e eu procurando totalmente perdido por alguém que nem existe. E a dúvida começou a me perseguir.
E se ela quis me conhecer pelos meus defeitos, eu devo mudar para agradar às outras? Sempre achei que elas queria um homem como eu, e sempre errei. Por isso, eu quero deixar de ser assim.
Mas e ela? Não foi isso que nos aproximou? Se eu não tivesse reclamado tanto do que aconteceu, será que nós teríamos conversado?
São tantas dúvidas. O melhor mesmo é deixar tudo acontecer. O que for pra ser vai ser! É bom mesmo eu deixar de me criticar por ser assim e passar a gostar mais de mim.
Talvez... o amor esteja ao meu lado.

Um comentário:

  1. "É bom mesmo eu deixar de me criticar por ser assim e passar a gostar mais de mim." EU CONCORDO! E mais, tu realmente estás procurando a mulher certa nas comuns. A mulher que é pra ti vai amar cada célula do teu corpo, e vai te amar a cada nova vez que respirares. Vai te amar só por existires. Vai te amar por tu seres que és, e não quem ela gostaria que tu fosse. Fica a dica!
    Amei teu texto. Perfeito.

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